Desde que a Marfrig adquiriu uma participação de controle na BRF (ações BRFS3), a análise financeira da empresa tornou-se mais complexa. A alavancagem e a contribuição de valor de cada segmento, incluindo a participação na BRF e em outras empresas operacionais, têm dificultado o processo de avaliação do desempenho consolidado da Marfrig. Atualmente, o valor de mercado da BRF representa 159% do patrimônio líquido da Marfrig, o que reflete a importância crescente da BRF no portfólio da companhia, principalmente devido ao bom momento do setor avícola no Brasil e à melhora na execução operacional da empresa.
A Complexidade da Alavancagem da Marfrig
A alavancagem da Marfrig é analisada de duas maneiras: como uma entidade independente e considerando a participação na BRF e na National Beef (NB). No 2º trimestre de 2024, a Marfrig reportou uma dívida líquida de R$39,1 bilhões, que aumenta para R$43,8 bilhões ao incluir o leasing e outras dívidas. Excluindo a BRF, a dívida líquida independente da Marfrig é de R$30,7 bilhões, representando uma alavancagem de 8,9x em relação ao EBITDA do segmento de carne bovina nos últimos doze meses.
No entanto, quando incluímos a participação da Marfrig de 51% na BRF e 18% na NB, a dívida líquida consolidada cai para R$37,3 bilhões, e a alavancagem reduz para 5,3x o EBITDA. Apesar desse alívio, a pressão continua, principalmente nas operações de carne bovina dos Estados Unidos.
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Venda de Ativos para a Minerva
A venda de 16 plantas de processamento de carne bovina e cordeiro da Marfrig para a Minerva, que abrange operações no Brasil, Uruguai, Argentina e Chile, trouxe algum alívio financeiro. Essa venda, feita a múltiplos mais elevados do que a própria alavancagem da Marfrig, ajudou a reduzir a dívida. Após essa transação, a estimativa é que a dívida líquida da Marfrig caia para R$23,4 bilhões no final de 2024, resultando em uma alavancagem de 9,4x. Quando incluímos a BRF na equação, a dívida consolidada ajustada fica em R$29,2 bilhões, com uma alavancagem de 4,1x.
Entretanto, as margens operacionais da Marfrig ainda podem sofrer pressão, principalmente devido à contínua fraqueza do ciclo de carne bovina nos EUA e à expectativa de normalização das margens da BRF em 2025, o que elevaria a alavancagem consolidada para 4,8x.
Pressões de Margem e o Papel da BRF
As operações de carne bovina da Marfrig são impactadas de maneira distinta em diferentes regiões. Na América Latina, a empresa continua se beneficiando de um ciclo positivo de gado, que deve sustentar bons resultados até 2025. Porém, nos EUA, a situação é bem diferente. O rebanho de gado está no menor nível em 70 anos, e a retenção de novilhas está apenas começando, o que significa que a recuperação das margens de carne bovina nos EUA pode demorar até 2027.
Por outro lado, a BRF está em uma fase bastante positiva. A combinação de custos mais baixos de grãos e uma oferta e demanda equilibradas tem gerado margens sólidas no setor de aves e suínos. No entanto, a sustentabilidade dessas margens é questionável, uma vez que o ciclo avícola tende a ser curto (cerca de nove meses). Ainda assim, a BRF tem aproveitado a oportunidade para se recuperar financeiramente, algo que poderia beneficiar a Marfrig indiretamente.
Dividendos da BRF: Uma Ajuda Cautelosa
Com o desempenho positivo da BRF, há a expectativa de que a empresa retome o pagamento de dividendos, o que pode ser uma boa notícia para a Marfrig. No entanto, essa estratégia deve ser adotada com cautela. A Marfrig poderia usar esses dividendos para reduzir sua dívida, mas a BRF também precisa aproveitar o momento favorável para reduzir sua própria alavancagem e aumentar sua capacidade produtiva, especialmente em regiões como o Oriente Médio.
Esse aumento de capacidade é vital para a BRF manter sua liderança de mercado, especialmente diante de concorrentes como a Seara, que tem investido em expansão. No setor de proteínas, onde a capacidade de produção se traduz diretamente em mais vendas, a BRF precisa estar preparada para não perder participação de mercado.
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Uma Estratégia para a Marfrig: Venda de Ativos LatAm?
Para enfrentar os desafios de alavancagem, uma estratégia potencial para a Marfrig poderia ser a venda de suas operações restantes de carne bovina na América Latina. Essas plantas, focadas na produção de hambúrgueres e carne bovina orgânica, poderiam ser vendidas à própria BRF, que já é um dos maiores clientes. Isso ajudaria a Marfrig a reequilibrar sua dívida e focar em outras áreas de crescimento.
O Futuro das Ações BRFS3
Com base no desempenho atual da BRF, as ações BRFS3 se tornaram um componente vital para o valor da Marfrig. Atualmente, o mercado atribui uma avaliação negativa às operações independentes da Marfrig, enquanto a participação na BRF é vista como um ativo de alto valor. Se as ações BRFS3 continuarem a subir, as ações da Marfrig provavelmente seguirão o mesmo caminho. No entanto, qualquer queda nas ações da BRF pode amplificar as dificuldades da Marfrig.
A redução da alavancagem deve ser uma prioridade para a Marfrig, mas os desafios permanecem, especialmente com o ciclo de carne bovina nos EUA ainda distante de uma recuperação e a possibilidade de correção no ciclo de aves da BRF. Com essas incertezas, os analistas recomendam cautela em relação às ações BRFS3 e à própria Marfrig. Embora o preço-alvo das ações tenha sido elevado para R$17, o potencial de valorização ainda é limitado.
A BRF, representada pelas ações BRFS3, tem sido uma âncora crucial para a Marfrig, proporcionando um alívio significativo em meio aos desafios financeiros. No entanto, os riscos permanecem, e a sustentabilidade das margens tanto da BRF quanto da Marfrig é questionável no longo prazo. Os investidores devem monitorar de perto o desempenho de ambas as empresas, especialmente no que diz respeito à alavancagem e à capacidade de enfrentar os desafios do mercado de proteínas nos próximos anos.