O mundo está mudando diante dos nossos olhos. A ordem global está sendo reescrita, e as consequências desse movimento são extremamente difíceis de prever.
A guerra comercial iniciada por Donald Trump pode acabar a qualquer momento com um simples tweet – ou pode se arrastar indefinidamente. Essa incerteza é o que mais preocupa analistas e investidores.
Atualmente, as decisões sobre tarifas nos Estados Unidos têm sido tomadas de forma unilateral pelo presidente, mesmo que a Constituição americana atribua esse poder ao Congresso. Trump se aproveita de brechas legais, alegando emergência nacional, e encontra pouco ou nenhum contraponto dentro do próprio partido, já que sua popularidade intimida possíveis dissidentes. Esse comportamento, que lembra mais um monarca do que um presidente, é algo que historicamente não combina com a cultura política americana.
Se essas tarifas persistirem, a tendência é que os Estados Unidos entrem em recessão. Tarifas em escalas menores já fracassaram no passado – o exemplo clássico é o Smoot-Hawley, que agravou a Grande Depressão nos anos 1930. Mesmo que as tarifas sejam revertidas rapidamente, o estrago já pode estar feito, como alertam economistas como Paul Krugman e Nouriel Roubini.
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Três cenários principais se desenham:
Cenário 1:
Trump recua e reduz as tarifas, mantendo uma taxa de 10% sobre as importações, o que seria apresentado como uma vitória política. O impacto seria menor, mas a incerteza já teria causado danos à confiança dos agentes econômicos.
Cenário 2:
As tarifas permanecem. A economia começa a contrair, não apenas pelo efeito direto das tarifas, mas pela incerteza que elas geram. Empresas adiam contratações e investimentos, preparando-se para tempos difíceis. O desemprego aumenta, e a popularidade do presidente começa a cair, inclusive entre eleitores que antes o apoiavam por promessas de redução de impostos. O Congresso, pressionado pela opinião pública, pode eventualmente retomar o controle sobre a política tarifária.
Cenário 3:
Há quem veja uma estratégia mais sofisticada: ao provocar uma recessão, o governo forçaria o Federal Reserve a cortar juros, reduzindo o custo da dívida americana, que já ultrapassa 37 trilhões de dólares, com 10 trilhões vencendo neste ano. No entanto, esse caminho é arriscado. Com um déficit fiscal de 6–7% do PIB mesmo em pleno emprego, uma recessão só agravaria o desequilíbrio, exigindo mais emissão de dívida e, possivelmente, de moeda. O risco de uma crise de confiança nos títulos americanos não pode ser descartado.
Sobre o discurso de “trazer a manufatura de volta para os EUA”, é importante lembrar que tarifas podem ser úteis em situações pontuais, mas não resolvem todos os problemas. Muitos empregos industriais migraram para o exterior por questões de custo e regulação ambiental. Por exemplo, a produção de minerais estratégicos, essenciais para tecnologia, poderia ser feita nos EUA, mas o impacto ambiental é um impeditivo. Além disso, a automação já substitui grande parte da mão de obra nesses setores.
A ideia de que os EUA voltarão a produzir tênis e camisetas em massa ignora o fato de que esses empregos pagam pouco e não atraem trabalhadores americanos. E, se essas fábricas voltassem, seriam altamente automatizadas, empregando poucas pessoas.
O desequilíbrio comercial dos EUA é, ao mesmo tempo, um problema e uma consequência do dólar ser a principal moeda de reserva global. Isso permitiu aos americanos financiarem déficits a custos baixos, já que estrangeiros compram títulos do Tesouro. Se o déficit comercial diminuir, a demanda pelo dólar pode cair, afetando sua hegemonia.
No Brasil, observamos esses movimentos com atenção. O impacto de uma recessão nos EUA seria sentido globalmente, inclusive aqui, afetando exportações, fluxo de capitais e o câmbio. Segundo o Banco Central, cerca de 20% das exportações brasileiras têm os EUA como destino direto ou indireto, e qualquer desaceleração lá repercute em nossa economia.
Vale lembrar: nos Estados Unidos, mercados em alta estendem o horizonte dos investidores, enquanto mercados em baixa o encurtam drasticamente. Se o seu horizonte de investimento em ações americanas não é de 7 a 10 anos, talvez não devesse estar muito exposto à renda variável por lá. Por outro lado, historicamente, é durante os mercados de baixa que se constroem os melhores retornos, mesmo que isso só fique claro anos depois.
E quanto à bolsa brasileira? Em teoria, uma forte queda nos mercados americanos poderia abrir espaço para valorização relativa de mercados emergentes, como o Brasil, especialmente se investidores globais buscarem diversificação ou ativos descontados fora dos EUA. No entanto, na prática, a correlação entre as bolsas é alta: choques negativos nos Estados Unidos costumam gerar aversão ao risco e saídas de capital de países emergentes, pressionando o Ibovespa e o real. Por outro lado, se o Brasil conseguir avançar em reformas, manter a inflação sob controle e apresentar crescimento acima do esperado, pode atrair parte desses recursos em busca de oportunidades, principalmente se a bolsa local estiver barata em relação aos fundamentos.
Ou seja, a queda da bolsa americana pode até abrir oportunidades para o Brasil, mas o cenário global de aversão ao risco tende a afetar negativamente todos os mercados no curto prazo. O investidor brasileiro precisa, mais do que nunca, ter paciência, visão de longo prazo e atenção à diversificação.
Como ficam os principais ativos do investidor brasileiro nesse cenário?
Diante desse ambiente de incerteza global, é fundamental entender como os principais ativos de referência para o investidor brasileiro tendem a se comportar.
Veja o quadro comparativo abaixo:
Ativo | Comportamento Esperado em Recessão nos EUA / Aversão ao Risco Global | Explicação |
IPCA+ | Volatilidade no curto prazo, proteção no longo | Pode sofrer com marcação a mercado se juros subirem, mas protege contra inflação no vencimento. |
CDI+ | Defensivo, tende a se beneficiar | Pós-fixados ganham com juros altos e são porto seguro em momentos de estresse. |
Bitcoin | Alta volatilidade, potencial de valorização no longo prazo | Pode cair junto com ativos de risco, mas se beneficia se houver crise de confiança em moedas tradicionais. |
Ouro | Tendência de valorização | Tradicionalmente buscado como proteção em crises, inflação e desvalorização do dólar. |
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Explicando o quadro:
Títulos pós-fixados (CDI+) tendem a ser os mais defensivos no curto prazo, pois se beneficiam de juros elevados e oferecem liquidez. O Tesouro IPCA+ pode apresentar volatilidade, mas protege o investidor contra a inflação no longo prazo, desde que o título seja mantido até o vencimento. O ouro, por sua vez, é o ativo clássico de proteção em cenários de crise e costuma se valorizar quando há fuga de ativos de risco. Já o bitcoin, apesar de ser visto como alternativa ao sistema financeiro tradicional, ainda apresenta alta volatilidade e pode sofrer quedas em momentos de pânico, mas pode se valorizar se a crise envolver perda de confiança nas moedas fiduciárias.
A diversificação entre esses ativos é fundamental para atravessar períodos de turbulência global, protegendo o patrimônio e aproveitando oportunidades que surgem em meio à volatilidade.