Se você tem o hábito de começar o dia com uma boa xícara de café, provavelmente já sentiu no bolso a diferença nas prateleiras do supermercado. O preço do café, tão essencial para milhões de brasileiros, ficou 77,78% mais caro nos últimos 12 meses, segundo dados recentes do IPCA, divulgados pelo IBGE. Em algumas capitais, como Belo Horizonte e Goiânia, a alta ultrapassou os 100%. E não para por aí: o produto começou a ganhar grades antifurto em supermercados de todo o país, algo que até então era reservado a itens considerados de luxo.
Mas o que está por trás desse aumento expressivo no preço do café? Para entender melhor, vamos conversar sobre os fatores que pressionaram a produção, a demanda e toda a logística dessa cadeia tão presente no nosso dia a dia.
Oferta global em queda e o impacto do clima
Boa parte dessa disparada tem origem fora do Brasil. O Vietnã, segundo maior produtor mundial de café e líder no cultivo do tipo robusta, enfrentou uma quebra de safra severa devido às condições climáticas extremas. O problema reduziu drasticamente a oferta global do grão e impactou diretamente os preços internacionais.
No Brasil, maior produtor e exportador do mundo, a situação também não foi das melhores. O país enfrentou seca e ondas de calor ao longo de 2024, comprometendo a produtividade principalmente das lavouras de arábica, variedade mais valorizada. A estimativa é de uma queda de 10,6% na produção de arábica, o que deve derrubar a safra total em 5,8% neste ano, segundo o IBGE.
Renato Garcia Ribeiro, pesquisador do Cepea, destaca que, mesmo com chuvas durante a florada do cafeeiro, o estresse hídrico das plantas levou ao aborto de frutos. Em outras palavras, as árvores estavam tão debilitadas que não conseguiram sustentar os grãos. Em muitas propriedades, a solução foi “esqueletar” os cafeeiros, ou seja, podar drasticamente para preservar a vitalidade das plantas para safras futuras.
Logística mais cara e exportações aquecidas
A guerra no Oriente Médio também contribuiu para encarecer o frete marítimo. O canal de Suez, uma das principais rotas de exportação entre Ásia e Europa, foi alvo de ataques, forçando a adoção de rotas alternativas mais longas e custosas. Isso elevou os preços dos contêineres e gerou um efeito dominó no valor final do café.
Ademais, a crescente demanda internacional, com destaque para a China, que saltou da 20ª para a 6ª posição entre os maiores compradores do café brasileiro, ajudou a reduzir a disponibilidade interna. Ou seja, enquanto o mundo descobria o café nacional, o consumidor brasileiro sentia o impacto da menor oferta.
Consumo resiliente, mesmo com os preços
Apesar da alta expressiva no preço do café, o consumo segue em crescimento. Dados da Abic mostram que o consumo nacional cresceu 1,1% entre janeiro e outubro de 2024. Isso porque, mesmo com a alta dos preços, muitos brasileiros mantêm o hábito e utilizam estoques domésticos para suavizar o impacto das oscilações.
Outro ponto importante: mesmo com o preço nas alturas, mercados como Estados Unidos, Europa e Ásia, considerados menos sensíveis ao custo, seguem demandando o produto. Isso colabora para manter os preços elevados.
E o robusta?
Com a quebra de safra no Vietnã, os preços do café robusta também dispararam. Em setembro de 2024, o robusta chegou a ser mais caro que o arábica, algo que não acontecia há sete anos. Como o Brasil produz principalmente arábica, e o robusta responde por apenas 20% da área plantada, a demanda pelo robusta brasileiro também cresceu, impulsionando ainda mais as exportações e, claro, os preços.
Grade antifurto e adaptações no varejo
Diante desse cenário, alguns supermercados passaram a adotar grades de segurança nas prateleiras de café. A imagem de pacotes protegidos como produtos eletrônicos viralizou e virou símbolo do atual momento de encarecimento. Em cidades como São Paulo, Belo Horizonte e Goiânia, o preço do quilo do café já ultrapassa os R$ 65.
Segundo Fernando Gonçalves, do IBGE, o preço do café no mercado internacional segue em alta e deve continuar pressionando os custos para o consumidor brasileiro. A expectativa de recuo nos preços é apenas para 2026, com uma possível safra recorde caso o clima colabore.
Preço do café: E os próximos passos?
A curto prazo, o preço do café deve continuar elevado. A colheita da safra de 2025 ainda está por vir e as estimativas não são otimistas. Apenas com uma melhora climática consistente e uma boa safra em 2026 poderemos ver um alívio nos preços.
Enquanto isso, a indústria deve seguir investindo em mudanças de embalagem e formatos de venda para amenizar o impacto no bolso do consumidor, como pacotes menores ou linhas mais acessíveis. Em 2024, o setor faturou R$ 36,82 bilhões, alta de mais de 60% frente a 2023, segundo a Abic.