Mercado Livre vai entrar em farmácias, entenda o impacto bilionário no setor

Entrada do Mercado Livre em farmácias deve pressionar margens da RD Saúde e ameaçar farmácias independentes, aponta análise do Itaú BBA.
Mercado Livre

A notícia de que o Mercado Livre pode entrar no mercado farmacêutico brasileiro já provoca ondas de especulação entre analistas, e concorrentes do setor. A possível incursão do gigante de na venda de medicamentos representa uma mudança estrutural, especialmente em um país onde a penetração do varejo online nesse segmento cresce de forma acelerada.

De acordo com relatório do Itaú BBA, o movimento deve machucar as margens da RD Saúde – dona das redes Raia e Drogasil – mas o maior impacto será sentido pelas farmácias independentes, que já enfrentam dificuldade de competir com grandes grupos e plataformas digitais.

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Curiosamente, apesar do barulho no setor, a entrada do em farmácias mexeria pouco no ponteiro da própria companhia. Isso porque o valor total de vendas (GMV) da plataforma no Brasil já supera sozinho todo o mercado de medicamentos vendidos em farmácias no país.


Números que impressionam

Em 2024, o GMV do Mercado Livre no Brasil somou US$ 24 bilhões e, segundo estimativas, deve alcançar US$ 33 bilhões em 2025. Em contrapartida, o mercado brasileiro de medicamentos movimenta cerca de US$ 27 bilhões anuais – incluindo remédios de balcão (OTC), avaliados em US$ 8,5 bilhões, e medicamentos sob prescrição, que somam US$ 18,5 bilhões.

Ou seja, mesmo que o Mercado Livre capturasse fatia relevante do mercado farmacêutico, o impacto seria relativamente pequeno no consolidado da companhia. Ainda assim, especialistas destacam que a questão não é apenas volume, mas estratégia de recorrência.

Medicamentos fazem parte da rotina de milhões de brasileiros e representam um canal poderoso de fidelização. Como destaca Rodrigo Gastim, analista do Itaú BBA, “essa é uma categoria que impulsiona recorrência e retenção dentro da plataforma, apoiando também estratégias de cross-sell em outros setores”.


Primeiros passos: foco em medicamentos sem prescrição

O Itaú BBA projeta que o Mercado Livre em farmácias deve começar pelos medicamentos OTC (over the counter), vendidos sem necessidade de receita médica. A escolha faria sentido por três motivos principais:

  1. menos complexa em comparação a medicamentos controlados;

  2. Margens brutas mais atrativas – em torno de 35%, contra apenas 15% a 17% nos medicamentos com prescrição;

  3. Alta penetração online, hoje em 26% no Brasil, nível comparável ao dos e acima da média global, que gira em torno de 20%.

Se confirmada essa estratégia, o banco projeta que o Mercado Livre poderia alcançar US$ 2 bilhões em vendas de medicamentos até 2030, equivalente a 3% do GMV total da plataforma no Brasil.


O desafio dos medicamentos com prescrição

Entrar no mercado de medicamentos sob prescrição seria um passo mais complexo. Além de exigir integração com sistemas de retenção de receita e maior controle logístico, trata-se de um segmento em que o varejo físico ainda mantém vantagens competitivas.

Nos Estados Unidos, até mesmo a Amazon enfrentou dificuldades em escalar esse modelo, permanecendo mais forte nos medicamentos OTC.

Ainda assim, analistas apontam espaço para o Mercado Livre em farmácias nos remédios de uso crônico, que representam 55% a 60% da receita do setor. Por serem compras recorrentes e mais sensíveis a preço, esse nicho pode ser explorado via assinaturas e compras programadas.

Se a penetração online desse segmento chegar a 30% até 2030 e o Mercado Livre conquistar 25% de market share, a categoria representaria 3,5% do GMV total da plataforma no país.


Concorrência: RD Saúde na linha de frente

O maior concorrente direto a ser impactado é a RD Saúde, líder do setor farmacêutico brasileiro. Embora a rede não deva perder market share em termos absolutos, o Itaú BBA estima que a empresa terá de reduzir preços para competir, o que pressionará suas margens.

Segundo as projeções, a margem bruta da RD pode sofrer redução de até 200 pontos-base nos próximos anos. Isso porque medicamentos OTC representam 11% das vendas e os com prescrição, 54%, ambos diretamente afetados pela entrada de um player digital com poder de preço agressivo.

Esse movimento já vem sendo observado em segmentos como higiene e beleza, onde o e-commerce roubou participação e derrubou margens.


Farmácias independentes: as mais vulneráveis

Se para a RD Saúde o desafio é preservar margens, para as farmácias independentes o cenário é ainda mais delicado. Essas operam, em geral, com margens de apenas um ígito. Assim, qualquer perda de competitividade pode significar saída do mercado.

Atualmente, as independentes respondem por 17% das vendas da indústria farmacêutica. De acordo com as estimativas, se o Mercado Livre ganhar espaço e reduzir preços, de 25% a 45% desses players poderiam ser eliminados do mercado até 2030.

Essa tendência já é visível: desde 2014, os pequenos perderam 13 pontos de participação de mercado, enquanto a RD capturou cerca de metade desse espaço com novas unidades e expansão agressiva.


Impacto desigual

A entrada do Mercado Livre em farmácias representa um divisor de águas para o setor. Para a plataforma, o movimento deve trazer ganhos estratégicos em recorrência e fidelização, embora tenha impacto limitado em sua receita consolidada.

Para a RD Saúde, o desafio será administrar margens menores sem perder competitividade. Já para as farmácias independentes, a sobrevivência pode estar em risco diante da pressão de preços e da força logística da gigante do e-commerce.

No fim, como em tantas batalhas de mercado, quando os gigantes colidem, os pequenos são os mais afetados.

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