A confiança do consumidor brasileiro continua em terreno frágil ao entrar no último trimestre de 2025, refletindo um ambiente de persistentes desafios macroeconômicos e incertezas globais. De acordo com levantamento divulgado pela McKinsey e analisado pelo BTG Pactual, os índices de confiança recuaram sete pontos percentuais em relação ao final de 2024, ficando menos da metade dos níveis observados no terceiro trimestre de 2023. Esse quadro evidencia não apenas a sensibilidade das famílias ao ambiente econômico, mas também a complexa adaptação a um “novo normal” de consumo.
Inflação, juros e renda comprimem otimismo
Entre os principais fatores que pressionam a confiança do consumidor estão a inflação e os juros elevados. Mesmo após a desaceleração recente dos preços dos alimentos, o peso desse item no orçamento familiar ainda é desproporcional, sobretudo para as camadas de menor renda. Além disso, a Selic em 15% mantém o custo do crédito alto, afetando bens duráveis, habitação e qualquer compra financiada.
Outro elemento de pressão vem do cenário internacional. A volatilidade das commodities, a desaceleração da demanda externa e o ambiente de incerteza geopolítica dificultam a recuperação da confiança. Apesar disso, há sinais de leve melhora: o pessimismo diminuiu, sobretudo entre consumidores mais velhos, sugerindo que parte da população está ajustando expectativas em vez de simplesmente cortar gastos.
Vendas resilientes no varejo
Apesar do clima de cautela, o varejo brasileiro tem mostrado resiliência. Embora os volumes de vendas estejam em queda, os preços médios mais altos — resultado tanto da inflação quanto da seletividade dos consumidores — sustentam a receita do setor. O mercado de trabalho, com desemprego em mínimas históricas, também tem contribuído para evitar uma retração mais acentuada no consumo.
Varejistas com maior disciplina de preços e estratégias promocionais bem calibradas estão conseguindo capturar o gasto das famílias. Produtos essenciais se mantêm no radar, enquanto bens discricionários sofrem maior pressão. Nesse ambiente, empresas com forte poder de marca, cadeias de suprimento eficientes e capacidade de precificação têm se destacado.
Gastos seletivos e tendências de consumo
Um aspecto marcante é a mudança nas prioridades de consumo. Produtos frescos, combustíveis e outros itens essenciais continuam resilientes. Por outro lado, o consumo de carne caiu de forma significativa, pressionado por preços elevados e maior alocação das exportações, o que restringe a oferta doméstica.
No campo discricionário, há sinais de otimismo em setores específicos, especialmente turismo. Com a chegada da primavera e do verão, aumentaram as intenções de gastos em viagens, cruzeiros e locações de curto prazo. Já categorias como alimentos industrializados e roupas seguem pressionadas, com consumidores reduzindo volumes de compra.
Diferenças geracionais
A pesquisa aponta uma divergência relevante entre gerações. Baby boomers apresentaram uma queda de 13 pontos percentuais na busca por produtos mais baratos, reflexo de maior estabilidade financeira. A geração Z também mostrou disposição em manter gastos em categorias ligadas a moda e beleza, reforçando seu papel como motor de consumo seletivo. Já os millennials, mais endividados e em fase de formação de famílias, registraram aumento na procura por alternativas mais baratas.
Essas diferenças sugerem que estratégias de varejo precisarão ser cada vez mais segmentadas. Enquanto a geração Z busca experiências ligadas ao estilo de vida, os millennials permanecem cautelosos e focados em reduzir custos.
Oportunidades e riscos para o varejo
Para os investidores, o setor de consumo ainda oferece oportunidades, mas com cautela. A percepção no mercado continua defensiva, com destaque para empresas como SmartFit e Vivara, vistas como apostas de longo prazo. A C&A tem ganhado espaço, enquanto o setor farmacêutico começa a mostrar fundamentos mais sólidos, embora ainda em patamar baixo de posicionamento.
Na outra ponta, supermercados seguem com volumes fracos, e a Natura (NATU3) não tem despertado tanto interesse dos investidores. A Azzas, por sua vez, é vista com riscos de execução.
De acordo com o BTG, uma valorização mais consistente das ações de varejo depende de dois fatores: uma queda nas taxas reais de longo prazo e revisões positivas nos lucros corporativos.
O que esperar para os próximos meses
Com base no relatório, a confiança do consumidor deve continuar pressionada até o fim de 2025, a menos que haja uma melhora significativa no cenário macroeconômico. A inflação, embora em desaceleração, ainda corrói parte da renda disponível, enquanto o crédito caro restringe o consumo. O alívio pode vir de um mercado de trabalho ainda aquecido e da resiliência seletiva de alguns segmentos.
Além disso, o comportamento dos consumidores brasileiros mostra que, mesmo em meio às dificuldades, há espaço para indulgências em áreas como moda e cuidados pessoais. Isso reforça que o consumo no Brasil não é apenas uma questão de renda, mas também de identidade e hábitos culturais.
A confiança do consumidor brasileiro em 2025 continua sendo um termômetro das tensões macroeconômicas. A queda nos índices não significa retração absoluta do consumo, mas sim uma adaptação das famílias a um ambiente de maior cautela. O desafio para empresas e investidores será identificar os nichos onde ainda existe disposição para gastar e ajustar estratégias conforme o comportamento de diferentes gerações.
Em suma, o consumidor brasileiro permanece resiliente, mas mais seletivo. O que se vê não é uma retração uniforme, e sim uma reorganização das prioridades de consumo, que pode criar oportunidades para negócios atentos às novas demandas.