Investidores registram perdas de até 93% com COEs da Ambipar e Braskem; entenda

Investidores registram perdas de até 93% com COEs da Ambipar e Braskem, vendidos por corretoras como XP e BTG. Entenda o que deu errado e como funcionam esses produtos estruturados.
COEs da Ambipar e Braskem

Os Certificados de Operações Estruturadas (COEs) voltaram ao centro das atenções do após gerarem prejuízos superiores a 90% para investidores que apostaram em produtos atrelados às empresas Ambipar (AMBP3) e . As perdas, informadas por corretoras como XP Investimentos e BTG Pactual, acenderam o alerta sobre a falta de compreensão dos riscos embutidos nesses ativos, muitas vezes vendidos como alternativas de “baixo risco” em portfólios de investimento.

De acordo com informações divulgadas nesta quarta-feira (8), os COEs vinculados às ívidas da Ambipar e da Braskem sofreram desvalorização de até 93%, o que significa que um investidor que aplicou R$ 1.000 em um desses produtos recebeu apenas R$ 70 de volta. Em termos práticos, a maior parte do capital foi perdida após as crises financeiras das duas companhias afetarem diretamente os títulos de dívida que lastreavam os produtos.

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O que são os COEs e por que eles perderam tanto

Os COEs são produtos híbridos que combinam renda fixa e renda variável. A estrutura de cada certificado depende de uma “carteira” de ativos escolhidos pelo emissor — que pode incluir , moedas, índices, derivativos ou títulos de crédito.
O objetivo é oferecer retornos superiores aos da renda fixa tradicional, mas mantendo algum grau de proteção do capital.

No entanto, essa proteção não é garantida em todos os casos. Existem COEs com “capital protegido” — em que o investidor recebe pelo menos o valor aplicado — e COEs com “capital em risco”, nos quais o retorno depende integralmente do desempenho dos ativos subjacentes. Foi exatamente este último tipo que envolvia as operações da Ambipar e da Braskem.

Ambas as companhias enfrentam problemas financeiros significativos.
A Ambipar, do setor ambiental, entrou com pedido de proteção judicial contra credores em setembro, após indícios de desorganização financeira e dificuldades para localizar recursos de caixa. Já a Braskem, maior petroquímica da , contratou assessores para rever sua estrutura de capital e renegociar dívidas, o que provocou desconfiança no mercado e queda nos preços de seus títulos.

Como os COEs dessas empresas eram lastreados em títulos de dívida corporativa (debêntures), as perdas foram imediatas. O resultado: queda drástica no valor de mercado dos papéis e gatilho de vencimento antecipado para os certificados, levando os investidores a receber apenas uma fração do valor investido.


“De renda fixa, só o nome”: a confusão do investidor

Parte do problema, segundo especialistas, é que os COEs muitas vezes são comunicados de forma simplificada, levando o investidor a acreditar que se trata de um produto “quase de renda fixa”. No entanto, a estrutura real pode envolver ativos de risco elevado, especialmente quando o emissor busca oferecer rentabilidades mais atrativas.

O próprio site da XP descreve os COEs como “investimentos que combinam produtos de renda fixa e variável”, mas, em muitos casos, a parcela variável domina o desempenho final. Assim, quando o ativo de referência sofre — como ocorreu com Ambipar e Braskem — o investidor pode ter perda total do capital.

Em comunicado aos clientes, a XP informou que os COEs ligados à Ambipar resultaram em pagamentos equivalentes a apenas 6,88% do valor investido, enquanto os COEs de Braskem retornaram entre 26% e 36,9% do capital inicial.
“Essa é a decisão final sobre os casos”, declarou a corretora aos assessores de investimento.


Reclamações se multiplicam nas redes e no “Reclame Aqui”

As perdas milionárias levaram dezenas de investidores a recorrer a plataformas de reclamação e redes sociais. No site “Reclame Aqui”, há diversos relatos de clientes que afirmam ter sido orientados por assessores a investir em COEs considerados de “baixo risco”.

Um investidor relatou ter aplicado R$ 68 mil no COE da Ambipar por recomendação da XP. “Apliquei confiando na consultoria e não percebi que era capital em risco. Um belo dia vi que o investimento havia derretido, e o banco trata como se fosse problema meu”, escreveu.

Outro cliente afirmou ter sofrido prejuízo com o COE da Braskem. “Fui surpreendido com a liquidação sem aviso. Se a empresa já enfrentava dificuldades, por que não fui alertado para tomar alguma medida?”, questionou.

Essas queixas evidenciam um problema recorrente no mercado: a falta de transparência e compreensão sobre o funcionamento dos COEs. Embora os documentos informem o risco, a complexidade do produto faz com que muitos investidores não consigam dimensionar a probabilidade de perda.


Um mercado em expansão e cada vez mais polêmico

Os COEs se popularizaram no Brasil na última década.
Segundo dados da B3, o volume total aplicado nessa modalidade superou R$ 90 bilhões em 2024, com produtos vinculados tanto ao Ibovespa quanto a empresas específicas. O crescimento foi impulsionado por campanhas de marketing agressivas de grandes corretoras, que passaram a promover os certificados como alternativa à renda fixa tradicional.

Contudo, a superior vem acompanhada de riscos complexos e baixa liquidez — características que nem sempre são devidamente explicadas ao investidor.
Muitos especialistas apontam que a atratividade dos COEs para as corretoras se deve também a comissões elevadas e vantagens tributárias: as operações são tributadas à alíquota de 15%, bem abaixo dos 40% que incidem sobre algumas receitas financeiras diretas das instituições.

Em março deste ano, o tema ganhou ainda mais polêmica quando a Grizzly Research, casa de análise norte-americana, publicou um relatório acusando corretoras brasileiras de usarem COEs como instrumentos para impulsionar lucros artificiais — chegando a compará-los a um “esquema de pirâmide financeira”.
Na ocasião, a XP rebateu as acusações, classificando o relatório como “notícia falsa” e afirmando que os produtos são regularizados e transparentes segundo as normas da CVM (Comissão de Valores Mobiliários).


Quem deveria investir em COEs?

Apesar da crise, especialistas afirmam que os COEs podem ter espaço em carteiras bem diversificadas, desde que o investidor entenda completamente os riscos envolvidos.
Esse tipo de aplicação é mais adequado para investidores com perfil agressivo e com tolerância a perdas significativas, pois o retorno depende da performance de ativos de risco, como ações, commodities ou créditos corporativos.

No caso de produtos lastreados em dívida privada, como os da Ambipar e da Braskem, a exposição é maior, pois não há proteção do Fundo Garantidor de Crédito () — mecanismo que cobre perdas em aplicações tradicionais, como CDBs e LCIs, até o limite de R$ 250 mil por CPF.

Já os COEs de capital protegido podem ser considerados mais conservadores, embora a rentabilidade seja limitada. Neles, o investidor recebe de volta o valor investido, mas o potencial de ganho é reduzido.


Um alerta ao mercado e aos investidores

O colapso dos COEs da Ambipar e da Braskem evidencia uma lição amarga para o mercado: produtos complexos exigem transparência, educação financeira e acompanhamento constante.
Embora as corretoras não tenham cometido irregularidades legais, o caso reforça a necessidade de revisão nas práticas de comunicação e recomendação de investimentos.

Para o economista Fábio Assis, especialista em derivativos, o episódio demonstra que a “sofisticação” nem sempre significa segurança.

“O COE é um instrumento legítimo, mas foi empacotado como se fosse algo simples. Quando um investidor comum compra um produto que mistura derivativos e crédito corporativo sem compreender o risco, o resultado dificilmente será positivo.”

Enquanto isso, os órgãos de fiscalização, como a CVM e o Banco Central, acompanham o caso e podem avaliar novas regras de transparência na distribuição desses produtos.

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