É difícil para qualquer observador atento do cenário macroeconômico não se incomodar com os sinais trocados emitidos pelo Banco Central na última reunião do Copom. A instituição elevou a taxa Selic a 14,75% ao ano, num movimento inesperado para a maioria dos agentes de mercado, que apostavam na manutenção do patamar anterior. Mais do que a decisão em si, o que causou estranheza foi a justificativa — ou melhor, a falta de coerência nas premissas apresentadas para sustentá-la. Por isso, muitos economistas e analistas financeiros apontam que o Banco Central se precipita.
Decisão técnica ou ruído estratégico?
O relatório divulgado pelo BTG Pactual foi categórico: a autoridade monetária comprou riscos desnecessários. De acordo com os analistas do banco, o Comitê de Política Monetária adotou uma postura conservadora em um momento em que o cenário global já mostra claros sinais de desaceleração, especialmente nos Estados Unidos e na Europa. A inflação começa a ceder em mercados desenvolvidos, o que tem levado seus bancos centrais a frear o ciclo de aperto monetário. Nesse contexto, a elevação da Selic vai na contramão da tendência global.
Contradição na leitura externa
O ponto central da crítica do BTG está na contradição do próprio comunicado do Copom. O documento afirma que os “efeitos defasados da política monetária restritiva nas economias centrais têm provocado desaceleração da atividade econômica global”. Ou seja, o Banco Central reconhece a perda de força da inflação global, mas mesmo assim opta por reforçar o aperto monetário interno. Não parece haver sintonia entre o diagnóstico e a prescrição.
Essa dissonância é perigosa. Como explica o relatório, decisões desse tipo afetam a previsibilidade e a credibilidade da política monetária, além de gerar incertezas para investidores, empresários e consumidores. Quando o Banco Central se precipita, o mercado sente — e reage.
Impactos econômicos no curto e médio prazo
A principal consequência imediata da decisão foi a valorização do real e uma breve queda nos juros futuros. No entanto, esses efeitos são passageiros. No médio prazo, o aumento da Selic tende a pressionar o custo do crédito, frear o consumo e os investimentos produtivos. A medida também eleva o custo de rolagem da dívida pública, o que complica ainda mais a já desafiadora equação fiscal brasileira.
Além disso, há o risco de que o aumento de juros provoque uma desaceleração ainda mais intensa do crescimento econômico. O PIB já vinha mostrando sinais de perda de fôlego, e o mercado de trabalho começa a dar indícios de enfraquecimento. Isso acende o alerta: será que o Banco Central está mirando uma inflação que já passou?
O que pensam os investidores?
A percepção predominante entre analistas é de que a decisão do Copom foi movida mais por cautela excessiva — ou até por pressões políticas e institucionais — do que por necessidade técnica. Muitos esperavam uma postura mais equilibrada, talvez mantendo a Selic estável e monitorando os efeitos das altas anteriores com mais paciência.
No relatório, o BTG Pactual também sugere que o Banco Central poderia ter comunicado melhor suas preocupações e cenários alternativos, em vez de adotar uma decisão que surpreende negativamente e gera ruídos desnecessários.
A credibilidade em jogo
A reputação do Banco Central como uma instituição técnica, independente e previsível é uma das âncoras da economia brasileira. Quando o Banco Central se precipita, como agora, essa âncora se enfraquece. E isso pode custar caro.
Seja pela elevação do risco-país, pelo aumento da volatilidade nos mercados ou pelo enfraquecimento da confiança de consumidores e empresários, o impacto de decisões mal calibradas vai muito além da taxa de juros. Afeta o ambiente econômico como um todo e, principalmente, o caminho da retomada do crescimento.
E daqui para frente?
Os próximos meses serão cruciais. O Banco Central terá que mostrar que mantém controle sobre o cenário, que é capaz de reavaliar suas decisões e, sobretudo, que continua comprometido com um modelo de política monetária baseado em dados, não em temores. Se isso acontecer, talvez o mercado perdoe o erro. Mas, se não, essa precipitação poderá marcar uma inflexão preocupante na gestão da economia brasileira.
Porque, no fim das contas, quando o Banco Central se precipita, é o país todo que paga a conta.