O caso do Banco Master, que oferecia CDBs com rentabilidades elevadas de até 120% do CDI, provocou uma forte reação regulatória. Como resposta, o Conselho Monetário Nacional (CMN) e o Fundo Garantidor de Créditos (FGC) anunciaram novas regras para o setor. As mudanças passam a valer a partir de 1º de junho de 2026 e visam limitar a exposição do FGC a riscos excessivos gerados por bancos de pequeno e médio porte.
Novas regras para uso do FGC
O FGC funciona como um seguro para investidores de renda fixa, protegendo valores aplicados em CDBs, LCIs e LCAs até o limite de R$ 250 mil por CPF e por instituição financeira. Entretanto, o caso do Banco Master mostrou como essa garantia vinha sendo utilizada como ferramenta de marketing por bancos com estratégias de alto risco. Em vez de operar com prudência, algumas instituições captavam recursos garantidos pelo FGC para investir em ativos arriscados como precatórios e ações voláteis.
Para evitar o mau uso da proteção oferecida, a nova regulação antecipa o gatilho da Contribuição Adicional (CA), uma taxa cobrada dos bancos que captam em demasia com garantia do fundo. Antes, a CA era acionada quando 75% das captações estavam cobertas pelo FGC. Agora, esse percentual caiu para 60%, aumentando o custo para bancos com dependência excessiva da garantia.
Além disso, a alíquota da CA foi dobrada, passando de 0,01% para 0,02% sobre os valores captados com garantia do FGC. Essa mudança tem como objetivo tornar a captação desenfreada menos atrativa, forçando os bancos a adotarem práticas mais conservadoras.
Restrição ao uso do FGC para captações exageradas
Outra medida relevante obriga os bancos que excederem em mais de dez vezes seu patrimônio líquido ajustado em captações garantidas a direcionarem o valor excedente para compra de títulos públicos. Essa exigência obriga as instituições a investirem em ativos considerados mais seguros, protegendo o sistema de eventuais perdas catastróficas.
A regulamentação foi interpretada por analistas como uma forma de blindar o FGC contra riscos sistêmicos. Henrique Castro, professor da FGV EESP, afirma que “os bancos estavam aplicando os recursos garantidos em ativos altamente arriscados, o que colocava o próprio FGC em perigo.”
Impactos para bancos médios e pequenos
Bancos menores são os principais impactados pela nova regulação. Gustavo Rabello, do SouzaOkawa, destaca que essas instituições dependem fortemente de produtos com garantia do FGC para captar recursos. Com a nova regra, a captação se torna mais cara e limitada, exigindo ajustes na estrutura de funding.
Lucas Dezordi, da PUC-PR, acredita que o mercado se ajustará rapidamente, com queda na oferta de CDBs com remunerações excessivas. “Taxas como 130% ou 140% do CDI devem desaparecer. Com as novas exigências e Selic a 15%, os bancos terão de reduzir promessas de rentabilidade.”
Perspectivas para o investidor
Do ponto de vista do investidor, a regulação aumenta a segurança dos ativos de renda fixa. Ao limitar a atuação dos bancos mais agressivos, o mercado tende a se tornar mais sólido. Marco Aurélio Cunha, da Guarnera Advogados, ressalta que o FGC ganhará mais robustez com maior arrecadação e exigência de aplicação em ativos de menor risco.
Andrea Alencar, do EFCAN Advogados, considera que a medida desestimula comportamentos imprudentes por parte das instituições financeiras. “Ao impedir que bancos se alavanquem de forma exagerada, o risco para o investidor é reduzido consideravelmente.”
Plataformas reagem ao caso Banco Master
Após os problemas envolvendo o Banco Master, muitas plataformas de investimento passaram a restringir a oferta de títulos de bancos com balanços frágeis. Marília Fontes, da Nord Investimentos, defende que o FGC não deve ser usado como selo de qualidade. “O investidor precisa avaliar o banco emissor e não confiar apenas na existência de uma garantia.”
Publicidade com o selo do FGC em debate
Outro ponto levantado por Fontes é o uso do nome do FGC como argumento de venda. Ela sugere que o uso do logotipo e frases como “garantido pelo FGC” seja proibido em campanhas publicitárias. “O FGC deve proteger o sistema, não promover bancos com risco elevado.”
Prazos para adaptação dividem opiniões
A nova regulação entrará em vigor apenas em junho de 2026. Para a Febraban, o prazo é excessivo. “Prazos longos incentivam o comportamento que precisa ser contido. Seria melhor antecipação”, disse Isaac Sidney.
Por outro lado, a ABBC considera o prazo adequado. Leandro Vilain, presidente da entidade, afirma que as mudanças exigem tempo. “Os bancos vão precisar reduzir alavancagem, depender menos do FGC ou captar mais capital dos acionistas. Tudo isso demanda planejamento.”
Qualidade dos ativos pode ser novo critério
Vilain sugere que o Banco Central considere a qualidade dos ativos dos bancos, não apenas seus números brutos. “Duas instituições com mesma alavancagem podem ter perfis de risco muito diferentes.”
Segundo ele, uma regulação mais precisa dependeria de critérios objetivos para avaliar liquidez e risco dos ativos, o que deve ser responsabilidade do Banco Central.
O caso Banco Master expôs uma distorção do sistema de garantias da renda fixa brasileira. As novas regras do FGC vêm para frear práticas arriscadas e promover maior estabilidade no mercado. Ainda que impliquem menor rentabilidade, sobretudo nos CDBs oferecidos por bancos médios e pequenos, as mudanças oferecem mais segurança ao investidor e fortalecem o sistema financeiro nacional.
Com isso, os próximos meses devem ser marcados por uma transição: menos promessas de retornos exorbitantes e mais transparência sobre os riscos envolvidos. Um sinal claro de que, no mundo dos investimentos, o equilíbrio entre segurança e rentabilidade continua sendo a chave para decisões saudáveis.