Quando Javier Milei assumiu a presidência da Argentina, em 10 de dezembro de 2023, ele não apenas fez história como o primeiro economista a ocupar o mais alto cargo do país, mas também como o primeiro libertário a liderar uma nação. Sua chegada ao poder representou uma ruptura drástica com os modelos políticos anteriores, trazendo promessas audaciosas de transformação em áreas críticas como economia e segurança pública.
Com apenas dois anos de experiência política — como deputado desde 2021 — e um histórico como comentarista de TV, Milei rapidamente conquistou uma posição de centralidade no cenário argentino. De acordo com o cientista político Miguel De Luca, da Universidade de Buenos Aires, “Ele tem uma centralidade absoluta, que se baseia em sua forma ‘disruptiva’ de fazer política e em sua capacidade de iniciativa.”
Entre as muitas marcas deixadas pelo presidente ao longo de seu primeiro ano, destacam-se as reformas econômicas e os esforços para reduzir a insegurança, duas das principais preocupações dos argentinos. Um ano de Javier Milei foi suficiente para consolidar mudanças impactantes, ainda que acompanhadas por desafios significativos.
🔍 Buscando ações promissoras? Baixe o guia gratuito de Small Caps do BTG!
Um Ano de Javier Milei: Transformações na Economia Argentina
A economia argentina, tradicionalmente marcada por décadas de instabilidade, enfrentava um dos piores momentos de sua história recente quando Milei assumiu o poder. A inflação mensal superava 25%, enquanto a inflação interanual alcançava assustadores 290% em abril de 2024. Em apenas um ano, o cenário inflacionário foi drasticamente alterado:
Tabela: Indicadores Econômicos no Primeiro Ano de Javier Milei
Indicador | Dez/2023 | Out/2024 |
---|---|---|
Inflação mensal (%) | 25,0 | 2,7 |
Inflação interanual (%) | 290 | 107 |
Consumo de massa (%) | – | -15 |
As políticas econômicas implementadas tiveram efeitos imediatos na estabilização do dólar e na valorização de títulos e ações argentinas, que atingiram preços recordes. Por outro lado, o país enfrentou a pior recessão da América Latina e uma queda de 15% no consumo de massa. Além disso, mais de 5 milhões de pessoas entraram na pobreza desde o início do mandato de Milei, marcando o maior aumento de pobreza na Argentina desde a crise de 2001-2002.
Avanços na Segurança
Em relação à segurança, um dos pontos centrais de sua campanha, Milei também obteve resultados expressivos. Na cidade de Rosário, que havia ganhado o título de “capital dos homicídios” devido à violência relacionada ao narcotráfico, o número de mortes caiu drasticamente. A redução da violência gerou impacto positivo na percepção de segurança entre os cidadãos, consolidando uma de suas promessas eleitorais mais importantes.
Outro ponto que marcou esse ano foi a diminuição dos piquetes — protestos com bloqueios de estradas —, que antes paralisavam frequentemente o trânsito em Buenos Aires. A ação do governo contra essas manifestações trouxe alívio a milhares de pessoas que dependem da mobilidade urbana diariamente.
Em apenas um ano, a Argentina vivenciou mudanças drásticas, que vão desde a estabilização parcial da economia até avanços na segurança pública. No entanto, os desafios sociais, como o aumento da pobreza e o impacto da recessão, mostram que o caminho para uma recuperação sustentável ainda será longo. Na próxima parte, analisaremos como Milei lidou com a política externa e as polêmicas que marcaram seu governo.
4 AS MUDANÇAS
1. Um Presidente Sem Partido
Na história recente da Argentina, poucos poderiam imaginar que alguém sem um partido político consolidado chegaria ao cargo mais alto da nação. Mas um ano de Javier Milei provou que o impossível pode se tornar realidade. O economista libertário alcançou a presidência com o apoio de uma coalizão improvisada, a Liberdade Avança (LLA), que só obteve o status legal de partido nacional em setembro de 2024, quase um ano após sua posse.
Historicamente, a política argentina sempre favoreceu candidatos com forte base partidária. No entanto, Milei quebrou essa tradição, movido por dois fatores fundamentais. Primeiro, a crescente decepção popular com os dois principais partidos do país: o kirchnerismo peronista e o macrismo. Segundo, sua habilidade em dominar o ambiente digital, com um discurso altamente polarizador e direcionado principalmente às redes sociais, onde conquistou o apoio fervoroso de homens jovens com menos de 35 anos.
Mesmo sem uma estrutura partidária robusta, Milei conquistou a presidência. Porém, sua coalizão obteve apenas 15% das cadeiras na Câmara dos Deputados e menos de 10% no Senado. Esses números geraram previsões sombrias sobre sua capacidade de governar, mas o presidente surpreendeu. Ele conseguiu aprovar suas principais propostas, mesmo com uma bancada minoritária.
Carteira de FIIs do mês disponível! Acesse e otimize seus investimentos
Estratégias para Superar a Minoria
O sucesso de Milei em aprovar suas medidas legislativas se deve, em grande parte, ao seu pragmatismo político. Segundo Marcos Novaro, diretor do Centro de Pesquisas Políticas (Cipol), o presidente demonstrou habilidade para negociar e formar alianças temporárias com legisladores da oposição, aproveitando a fragmentação entre os partidos tradicionais.
Além disso, Milei utilizou ferramentas executivas como os Decretos de Necessidade e Urgência (DNU) e os vetos presidenciais para contornar o Congresso em momentos críticos. Embora sejam instrumentos legais previstos na Constituição argentina, seu uso recorrente levantou críticas de opositores.
Tabela: Propostas Aprovadas no Primeiro Ano de Javier Milei
Proposta | Status | Método |
---|---|---|
Reforma Fiscal | Aprovada | Negociação com partidos aliados |
Dólar como moeda oficial | Parcialmente aprovada | Decreto de Necessidade e Urgência (DNU) |
Privatização de empresas estatais | Em andamento | Debate parlamentar |
Os críticos, como o deputado socialista Christian Castillo, acusam Milei de enfraquecer a democracia ao governar “como um monarca”, ignorando o Congresso em diversas ocasiões. Apesar disso, o presidente conquistou vitórias políticas significativas e demonstrou uma adaptabilidade surpreendente, mesmo sem experiência prévia em gestão pública.
Intuição e Habilidade Política
Javier Milei se revelou não apenas um economista comprometido com suas ideias libertárias, mas também um político com grande instinto para se adaptar às circunstâncias. Ele transformou um cenário de oposição fragmentada em vantagem estratégica, utilizando alianças temporárias e negociações pontuais para avançar sua agenda.
O pragmatismo de Milei e seu domínio no uso de decretos mostraram que, mesmo sem um partido tradicional, é possível consolidar poder e implementar mudanças significativas. Ainda assim, as críticas de centralização de poder seguem como um desafio para sua governabilidade nos próximos anos.
Na próxima parte, analisaremos como as propostas econômicas de Milei impactaram a sociedade argentina, equilibrando reformas e resistência popular.
2. Novo Estilo Presidencial
O primeiro ano de Javier Milei na presidência da Argentina não apenas trouxe mudanças políticas e econômicas, mas também marcou uma ruptura com o comportamento tradicional esperado de um chefe de Estado. Milei se destacou por adotar um estilo presidencial polêmico, frequentemente caracterizado por ataques diretos a críticos, discursos inflamados e um tom provocador, tanto no mundo digital quanto fora dele.
Com uma forte presença no X (antigo Twitter), Milei utiliza sua conta pessoal para desqualificar opositores, desde economistas e políticos até líderes universitários, acadêmicos e artistas. Seu tom, recheado de palavrões e provocações, vai além do esperado para alguém em sua posição. O presidente já foi acusado de publicar mensagens homofóbicas e de usar a palavra “deficiente” como insulto, gerando ampla repercussão negativa.
Seu comportamento disruptivo também é evidente em entrevistas e discursos públicos, onde costuma insultar adversários e até mesmo outros presidentes. Entre os alvos de suas críticas estão os líderes Luiz Inácio Lula da Silva, do Brasil, Andrés Manuel López Obrador, do México, e Gustavo Petro, da Colômbia, a quem frequentemente associa a termos pejorativos como “baratas”.
🌟 Descubra as 10 melhores ações da carteira 10SIM: faça o download agora!
O Impacto do Estilo Disruptivo
O estilo de liderança de Milei dividiu opiniões na Argentina. Enquanto seus seguidores o celebram como alguém genuíno e “fora do sistema”, seus críticos alertam para os riscos associados a esse comportamento. Analistas sugerem que sua abordagem combativa pode fomentar a violência política e enfraquecer as instituições democráticas.
Um dos exemplos mais notáveis do impacto negativo do “novo estilo presidencial” de Milei é sua relação com a imprensa. O presidente frequentemente critica jornalistas, referindo-se a eles como “corruptos, sujos e mentirosos”. Em uma postagem recente no X, ele declarou:
“O privilégio de casta que vocês [jornalistas] exerceram de forma tão violenta acabou. Aceitem que o mundo mudou para melhor e que seu monopólio das palavras terminou.”
Essas declarações renderam ao presidente uma série de denúncias de organizações de imprensa e geraram preocupação sobre a liberdade de expressão no país.
Além disso, Milei enfrentou críticas por suas frequentes demissões de integrantes do governo. Em apenas um ano, ele já substituiu dezenas de funcionários, incluindo o chefe de gabinete, o ministro da Infraestrutura e a ministra das Relações Exteriores. A instabilidade provocada pelas mudanças constantes afeta não apenas a governabilidade, mas também a relação do presidente com sua própria equipe, incluindo a vice-presidente Victoria Villarruel.
Tabela: Demissões de Funcionários no Primeiro Ano de Javier Milei
Cargo | Motivo da Demissão |
---|---|
Chefe de Gabinete | Divergências na gestão |
Ministra das Relações Exteriores | Polêmicas com aliados estrangeiros |
Ministro da Infraestrutura | Discordância com prioridades |
A Contradição Entre Popularidade e Controvérsia
Mesmo com um estilo presidencial controverso, no primeiro ano, Javier Milei conseguiu manter altos índices de aprovação popular, especialmente entre os jovens que o seguem fielmente nas redes sociais. Esses apoiadores veem Milei como uma figura autêntica, que rejeita formalidades e desafia o establishment político.
Entre suas excentricidades mais celebradas estão seu cabelo bagunçado, apelidado de “el Peluca”, e suas performances de rock em comícios. Essas características reforçam sua imagem como um outsider que despreza a “casta política”, um tema central de sua campanha presidencial.
Por outro lado, a preocupação com a estabilidade política e a centralização de poder segue como um dos principais desafios do governo Milei. Críticos destacam que seu estilo explosivo e o uso de ferramentas como decretos para contornar o Congresso podem enfraquecer o equilíbrio entre os poderes e a democracia argentina.
Após um ano de Javier Milei, seu estilo disruptivo continua a dividir o país. Enquanto seus seguidores o enxergam como um símbolo de mudança, seus opositores o acusam de colocar em risco a democracia e as instituições argentinas. Na próxima parte, exploraremos os efeitos das reformas econômicas e sociais que marcaram seu primeiro ano de mandato.
3. Javier Milei e o “Maior Ajuste da História da Humanidade”
Durante um ano de Javier Milei na presidência, o economista libertário implementou medidas que ele mesmo definiu como “o maior ajuste da história da humanidade”. Desde o início de seu mandato, Milei prometeu eliminar o déficit fiscal, um problema histórico da economia argentina, e cumpriu sua promessa com cortes orçamentários inéditos.
No primeiro semestre de 2024, os gastos públicos foram reduzidos em 35%, equivalente a 5,6 pontos percentuais do Produto Interno Bruto (PIB). Essa ação drástica foi crucial para alcançar o superávit fiscal, marcando um divisor de águas em uma economia que havia acumulado déficits em 113 dos últimos 123 anos. A redução da emissão monetária — antes usada para cobrir gastos — foi uma das principais ferramentas para combater a inflação, que caiu de 25% ao mês em dezembro de 2023 para 2,7% ao mês em outubro de 2024.
Mesmo com a recuperação de indicadores econômicos, o custo social dessas políticas foi alto. A recessão econômica, que contraiu o PIB em 3,4% em 2024, levou a um aumento de 11 pontos percentuais na pobreza. Hoje, mais de 53% dos argentinos não conseguem atender às suas necessidades básicas, incluindo sete em cada dez crianças, segundo o Instituto Nacional de Estatísticas e Censos (Indec).
💼 Sua estratégia de dividendos começa aqui! Baixe a Carteira de Dividendos BTG 📥
Os Impactos do Ajuste e a Recuperação Econômica
As políticas de austeridade de Milei também reverteram a situação das reservas do Banco Central, que estavam negativas quando ele assumiu. Além disso, o “risco-país”, indicador de confiança dos investidores, atingiu o menor nível em cinco anos, refletindo a recuperação da credibilidade argentina no mercado financeiro global.
Tabela: Indicadores Macroeconômicos no Primeiro Ano de Javier Milei
Indicador | Antes de Milei | Depois de Milei (Out/2024) |
---|---|---|
Inflação mensal (%) | 25,0 | 2,7 |
Risco-país (pontos) | 2.800 | 1.300 |
Reservas do Banco Central (US$) | -2 bilhões | +3 bilhões |
Apesar das melhorias macroeconômicas, as consequências sociais das reformas foram severas. Uma das medidas mais controversas foi a desvalorização do peso, que perdeu metade de seu valor em relação ao dólar. Isso agravou a crise de consumo e impulsionou a pobreza a níveis alarmantes, especialmente entre crianças.
Norma Piazza, pediatra especializada em nutrição, relatou à Reuters que a desnutrição infantil tem causado problemas graves, como convulsões e danos neurológicos, devido à falta de acesso a alimentos básicos.
Crescimento à Vista
Mesmo com os custos sociais, Milei projeta otimismo. Em novembro de 2024, ele anunciou o fim da recessão e prometeu que “de agora em diante, tudo o que resta é crescimento”. Projeções do FMI e do Banco Mundial indicam que a Argentina será o país de maior crescimento na América Latina em 2025, com previsão de alta de 5% no PIB.
Os críticos, no entanto, acusam o governo de usar “malabarismos financeiros” para alcançar o superávit fiscal, sugerindo que o financiamento com títulos do Tesouro apenas adia despesas e esconde déficits futuros.
Após um ano de Javier Milei, a Argentina encontra-se em um ponto de inflexão: enquanto as condições macroeconômicas melhoram, o desafio será traduzir esses avanços em benefícios concretos para uma população profundamente afetada pelas políticas de ajuste. Na próxima parte, exploraremos as implicações sociais e culturais das reformas de Milei e sua influência sobre o futuro da Argentina.
4. A surpreendente ascensão do Peso Argentino
Um ano de Javier Milei trouxe muitas transformações inesperadas para a Argentina, mas talvez a mais surpreendente tenha sido a valorização do peso. Durante sua campanha, Milei chamou a moeda argentina de “excremento” e propôs dolarizar a economia, além de “dinamitar” o Banco Central. Contudo, ao assumir a presidência, ele adiou esses planos e, de forma inesperada, fortaleceu tanto o peso quanto a instituição monetária que havia prometido destruir.
Fausto Spotorno, economista e ex-membro do Conselho de Assessores Econômicos, explicou que Milei enfrentou uma dívida enorme do Banco Central com bancos privados, herdada de governos anteriores. “Se ele dinamitasse o Banco Central com toda essa dívida, ele teria um problema com o sistema bancário,” afirmou Spotorno.
Consequências da Valorização do Peso
Apesar da valorização da moeda, que gerou estabilidade no curto prazo, surgiram novos desafios econômicos. A Argentina ficou cara em dólares, o que impactou diretamente o custo de vida da população, o setor turístico e a competitividade da indústria.
- Turismo: O aumento do custo em dólares afastou visitantes estrangeiros e impulsionou o êxodo de argentinos para destinos mais acessíveis, como Brasil, Chile e Uruguai.
- Indústria: A produção industrial tornou-se mais cara, tanto para o mercado interno quanto para exportação, criando dificuldades para os setores que dependem de preços competitivos.
Tabela: Efeitos da Valorização do Peso (2024)
Setor | Impacto |
---|---|
Turismo | Queda no número de visitantes estrangeiros |
Produção industrial | Alta nos custos para mercado interno e externo |
Custo de vida | Aumento significativo |
Apesar dessas dificuldades, Milei se manteve firme em não promover uma nova desvalorização abrupta do peso. Segundo Luis Caputo, ministro da Economia, o plano do governo é que o dólar oficial e o “dólar blue” (ou dólar paralelo) convirjam, criando condições para a suspensão dos controles de capital, conhecidos como “cepo”.
O Futuro do Peso e da Dolarização
Embora tenha adiado seus planos originais de dolarização, Milei continua comprometido com uma estratégia de transição. Ele propõe uma “dolarização endógena”, permitindo a livre concorrência entre moedas, onde o dólar se tornaria a principal moeda de poupança e transações. O objetivo final é eliminar o Banco Central e criar uma economia sustentada por livre mercado monetário.
O economista Diego Giacomini, porém, criticou a atual política cambial, afirmando que o câmbio valorizado “não serve para quem produz para o mercado interno nem para quem exporta.” Apesar dessas críticas, o governo confia que a estabilidade cambial e a eliminação dos controles de capital atrairão novos investimentos e restabelecerão a confiança na economia argentina.
Após um ano, o peso, que deveria ter sido abandonado, tornou-se um símbolo de resiliência econômica. Contudo, os desafios associados ao custo de vida elevado e à competitividade industrial permanecem como barreiras para um crescimento sustentável.
Na próxima etapa de seu governo, Milei terá que equilibrar a estabilidade alcançada com as reformas necessárias para garantir que os benefícios econômicos sejam amplamente distribuídos à população argentina.
LEIA TAMBÉM:
A melhor moeda do mundo? Peso argentino registra maior alta de 2024